19/04/2025

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Em favor do protagonismo juvenil no processo de sinodalidade eclesial

Em favor do protagonismo juvenil no processo de sinodalidade eclesial

Por Ronnaldh Oliveira[1]

Artigo publicado originalmente na revista Ekklesía Brasil, edição de janeiro-abril de 2022, n. 4, p. 23-26.

Foto: Luís Henrique Marques

A sinodalidade tem sido cada vez mais a palavra da vez, do ponto de vista eclesial, relacional, profissional e pessoal. Diante dos avanços do pensamento teológico e pastoral, é cada vez mais clara a necessidade da unidade para se chegar ao que sempre se entendeu ser Igreja.

A pergunta que certamente pode nos inquietar é justamente o que é o que sempre se entendeu sobre ser Igreja? É certo que na sua relação com a humanidade, com o auxílio do Espírito Santo, a Igreja sempre buscou discernir qual deveria ser seu papel em cada momento presente da História. Vale ressaltar, entretanto, que o essencial continua o mesmo.

Na sua essência, aquilo que sustenta a Igreja não vem do que pensam gregos ou troianos, europeus ou latino-americanos, mas nasce da unidade entre todos. Este sempre foi o querer de Jesus, rosto humano de Deus. Com efeito, afirmou o próprio Cristo: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (cf. Jo 10,10). Ele afirmou também: “Que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti: que também eles estejam em nós a fim de que o mundo creia que tu me enviaste” (cf. Jo 17,21).

Está na gênese eclesial a unidade de todos, a missão e a atuação na humanidade. O que por alguns momentos ocorreu, em nome da organização institucional, foi a fragmentação desse “todos” e o estado de dominação de poucos sobre a maioria. Os termos “controladores da graça” e “alfândegas da fé’’, utilizados pelo papa Francisco em sua exortação apostólica Evangellii Gaudium, evidenciam o quanto, ao não realizarmos a unidade, nos distanciamos do pedido de Jesus.

O que muito nos alegra é saber que Deus nunca se limitará a estruturas impostas, especialmente por teorias e normas que não surgem da experiência de vida pastoral. Ele nos escandaliza com sua bondade, dribla os critérios humanos e sempre arruma um jeito de ir além das nossas limitadas perspectivas. Ele é sempre Pai de amor, da misericórdia e da presença significativa na vida dos seus filhos, sobretudo os mais pobres e abandonados.

O jovem de Nazaré soube se colocar com clareza e objetividade nos lugares onde se encontrava, no templo, entre os doutores, fariseus, saduceus, junto às multidões, aos pecadores etc. Suspenso em uma cruz, não traiu sequer um minuto sua vocação à unidade. Seu sacrifício foi amor concreto e universal, sem reservas ou preferências.

As juventudes presentes na vida da Igreja

Na sociedade contemporânea, já há alguns anos, não falamos mais de juventude, mas nos referimo a juventudes, no plural, na consciência de que há diversas identidades juvenis: as do Hip Hop, as partidárias, as das artes, da academia, dos estudos entre outras. Eclesialmente, encontram-se também os jovens carismáticos, lectionautas, focolarinos, os pertencentes aos movimentos das congregações religiosas, os de Maria, das pastorais sociais e assim por diante. Tudo isso pra dizer que há muitos jovens engajados nas mais diferentes atuações e projetos.

A dinamicidade, a criatividade, o jeito novo e crítico de ver as coisas, a vivacidade do espírito são próprios da vocação juvenil. Com suas vidas, colocam em cheque argumentos e estruturas há tempos já estabelecidas e inegociáveis, causando por vezes certa indignação àqueles que estão nesses espaços há mais tempo. O papa Francisco, ainda em Evangellii Gaudium, é enfático ao afirmar que a pastoral em chave missionária deve abandonar sempre o dito “fez-se sempre assim’’, justamente para que além de se adequar aos tempos, chegue-se de fato ao coração das pessoas de hoje.

Pelo medo, receio ou por simplesmente limitar-se a ver os jovens como aprendizes inexperientes, há, em muitos, a tendência em subvalorizar ou mesmo desvalorizar a vocação de ser a juventude o “novo” de Deus hoje. Com frequência não há a confiança de que os jovens podem ser profundos nas ações ou tampouco levados a sério. A eles costuma-se delegar apenas pequenas responsabilidades. São mais úteis na venda de cartelas de shows de prêmios, acolhida e animação de eventos, no suporte tecnológico de lives e encontros online[2]. Em geral, isso parece acontecer por uma espécie de falta de confiança e, mais ainda, por receio de se trair hábitos consolidados, identificados com a típica segurança que procuram muitas pessoas adultas. São tradições com “t” minúsculo, no sentido que pouco têm a dizer aos novos contextos e a ensinar às novas gerações.

Deve-se dizer que já existem muitas iniciativas que evidenciam as juventudes e suas potencialidades, mas ainda não é o bastante. O grande desafio está no caminhar juntos, alinhar as ideias, dar oportunidades de crescimento, de evidenciar os dons, abrir espaços de escuta e de lideranças. Não há problemas se jovens liderarem os mais experientes de vida. Assim também fez Jesus, que liderou um grupo com pessoas com idade bem mais elevada que a sua e extramuros da instituição cristã, sendo conhecido entre os terapeutas como a maior e melhor liderança já existente na humanidade.

As Jornadas Mundiais das Juventudes, iniciadas por João Paulo II são, sem sombra de dúvida, espaços privilegiados para reafirmar os laços de esperança de que os jovens terão, de fato, seus verdadeiros espaços na construção do ser Igreja. O papa da juventude, em um de seus discursos, elucidou essa posição: “Não temam responder generosamente ao chamado do Senhor. Deixem que sua fé brilhe no mundo, que suas ações mostrem seu compromisso com a mensagem salvadora do Evangelho!”. Esse chamado será respondido dentro da comunidade de fé onde há pessoas que os acolham, acompanhem e permitam que tenham seus espaços de participação.

O papa Francisco, em mensagem enviada aos jovens por ocasião de uma vigília de oração na Itália, disse: “Queridos jovens, ao voltar para as suas casas e paróquias, não se deixem calar! Claro, quem fala pode errar, também os jovens, mas todos somos humanos e pecamos por imprudência! Mas, não tenham medo de errar e de aprender dos seus erros! Se alguém tentar tapar suas bocas, respondam que a Igreja e o mundo precisam dos jovens para se rejuvenescer”[3]. Este pensamento continua a ressoar em toda a Igreja ainda hoje, sobretudo quando o assunto é sinodalidade.

Rejuvenescer espaços, rever estruturas e posturas em conjunto com aqueles que já estão na caminhada é de fato uma significativa pedagogia da existência da Igreja. Pensar nisso e não medir esforços para crescer, salvará a Igreja de ser um museu histórico que apenas conta aquilo que um dia já se foi, com a tristeza de não se dizer o que poderia ser. O que nos deve santamente motivar é ter a consciência de que o Espírito Santo continua suscitando jovens para o seguimento do Cristo. Cabe a cada cristão presente na comunidade acolher e potencializar aqueles que chegam.

A Igreja, abraçando a sinodalidade como projeto de vida, engaja as juventudes segundo o que já consta em seus documentos. Como na passagem bíblica da samaritana, cada jovem dentro da comunidade pede de beber, pede formação e oportunidades de confiança e engajamento de seus dons, sem repressões, olhares “tortos’’ e excludentes. O Pai de Misericórdia chama a todos para uma experiência concreta de fé e amor recíproco. Não temos o direito de privar ninguém disso.

Pensar e construir juntos pontes ao invés de muros, sendo constantemente arquitetos do amor, da ternura e da empatia, aliando as ferramentas da experiência e inovação, calmaria e agitação é tudo aquilo que sacia e dinamiza o espírito eclesial no chamado equilíbrio que vem de Deus. O papel das juventudes crentes e não crentes na sinodalidade eclesial é ser sobretudo jovem (sem redundância), com poder de voz, de vez, de ação e articulação, não de forma romantizada, mas concreta. Os jovens precisam disso, desse espaço, dessa consciência de ser também esse seu lugar de ser quem se é. Já a Igreja como um todo precisa dar passos e com autenticidade rever prioridades, horários, projetos e acolhidas começando por quem já é “de casa”. Com efeito, a vocação da Igreja é ser lugar do encontro de comunhão e unidade, portando, de sinodalidade. Por isso, somos todos Igreja. Precisamos criar essa convicção.


[1] O autor é bacharel em Filosofia pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL), jornalista, pós-graduado em Influência Digital, Gestão e Estratégia, Gestão da Comunicação Social e Mídias Digitais. É também especialista em medidas socioeducativas, dependência química e jovens em Conflito com a lei. É docente especialista em Juventudes Contemporâneas; faz parte do Conselho nacional da Escola de Jovens por um Mundo Unido (EJPMU) e é presidente do Conselho Municipal de Juventudes (COMJUV) de Lorena/SP. É ainda responsável nacional pelo Setor dos Jovens religiosos e consagrados do Movimento dos Focolares (GenRe).

[2] Essas ações são, de forma alguma, menos importantes. A questão é que, muitas vezes, apenas esse tipo de serviço é confiado aos jovens, impossibilitando-os de assumir responsabilidades de outra natureza.

[3] O Santo Padre enviou uma videomensagem aos jovens participantes em uma vigília de oração mariana internacional, realizada na tarde de sábado no Santuário de São Gabriel, em Teramo, Itália, em preparação ao Sínodo dos Bispos sobre os Jovens. Notícia divulgada em 18 de março de 2018.

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